No período mais severo de pandemia que atravessamos até poucos dias atrás, a maior parte do comércio, escritórios e igrejas estava fechado. Eventos presenciais de toda espécie foram cancelados e vimos acontecer praticamente todos os dias um novo jeito de as pessoas se encontrarem: virtualmente. Aulas virtuais, palestras, reuniões e, até mesmo, missas e outras celebrações religiosas.
Chamou-me a atenção ver em frente de uma igreja o banner que mais ou menos dizia assim: “Fechou o templo, mas a Igreja continua aberta”. Achei essa frase de uma “sacada” formidável. Realmente, o templo precisou fechar porque a pandemia assim exigiu de todas as pessoas o chamado distanciamento social; uma vez que a proximidade física das pessoas pode facilitar o contágio pelo Covid-19. A placa lá disposta, contudo, sinalizava que a Igreja permanecia aberta.
A palavra Igreja tem sua origem na língua grega: “ecclesia”, que significa encontro de pessoas, assembleia cuja finalidade era pensar e planejar a vida, preparar o cotidiano. Do mundo civil grego, as comunidades cristãs adotaram essa expressão, assumindo, dando a ela, portanto, conotação religiosa. Ecclesia passou a significar a reunião de fiéis para partilhar a palavra e comungar do mesmo pão. Você pode conferir esse sentido de modo muito especial lendo o livro dos Atos dos Apóstolos, que narra a vivência das primeiras comunidades cristãs.
A pandemia nos forçou a pensar como anda a qualidade de nossos relacionamentos familiares; mostrou o quanto podemos nos sentirmos frágeis e, ao mesmo tempo, fortes. Aos que puderam permanecer em casa, tiveram oportunidade de fazer de sua casa o lugar do encontro, do diálogo, do fortalecimento dos laços. A casa foi lugar também do estranhamento; muita gente se estranhou neste período. Os limites da convivência foram provados, talvez alguns não resistiram às tensões e romperam.
Não ignorando todo o drama que a pandemia trouxe a todos nós, lembro que as famílias tiveram oportunidade de transformar sua casa no lugar propício para a oração, para o encontro, a leitura bíblica. A família é local onde inicia a catequese mais eloquente e eficaz para os filhos. Por mais que o templo precisara fechar, a Igreja doméstica manteve-se ativa e fecunda, vivendo o que era possível no tempo presente.
A Igreja, através do Concílio Vaticano II, ensina: “foi vontade de Deus santificar e salvar os homens, não isoladamente, sem conexão alguma de uns com os outros, mas constituindo um povo, que o confessasse na verdade e o servisse santamente” (LG, 9). A Igreja é definida como povo inserido na sociedade, fazendo experiência da comunhão fraterna e aberta a salvação trazida pelo Filho de Deus, Jesus Cristo.
Não se trata, portanto, de cada um fabricar um “deus” à sua imagem e semelhança, mas vivenciar a fé em família, entendendo que a casa é o lugar do cultivo primeiro da fé. Todos estávamos ansiosos pela reabertura de nossas igrejas-templo, para que lá, em comunidade, pudéssemos novamente fazer a experiência do encontro do Cristo com os demais irmãos e irmãs que comungam da mesma fé que nós comungamos. Poderíamos trazer aqui as palavras de São Cipriano (+258) que defende a importância da Igreja para o processo de nosso amadurecimento na fé e caminhada cristã: “Não pode ter Deus por pai quem não tem a Igreja por mãe”. A família deve ser sempre uma Igreja. A família e a igreja-templo devem ser verdadeiras aliadas para o crescimento e amadurecimento na fé daqueles que se consideram cristãos.
São Paulo, julho de 2020.
Frei Valdecir Schwambach