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Destaques, Notícias › 11/08/2020

ESPIRITUALIDADE FRANCISCANA: SANTA CLARA, ROGAI POR NÓS – Frei Michael Anthony Perry, OFM

Todos os anos, por ocasião do dia de Santa Clara, o Ministro Geral da Ordem dos Frades Menores endereça uma carta às Clarissas do mundo todo como forma de afeto, respeito, reflexão e comunhão. Acompanhe alguns trechos significativos do texto deste ano.

Minhas queridas Pobres Senhoras de Santa Clara, o Senhor lhes dê a paz!

“Ó Senhor Deus, eis que fui deixada sozinha por ti neste local”. Provavelmente, reconheceis que esse profundo grito de desolação foi pronunciado pela nossa Mãe Santa Clara, na vigília de Natal do ano 1252[1] quando, forçada à imobilidade por causa de sua grave doença, não pôde unir-se às suas irmãs para celebrar o Natal do Senhor. Como não podemos ver nesse suspiro o lamento de Jesus, em sua agonia no Jardim das Oliveiras? E o lamento de muitos nossos irmãos e irmãs, que ameaçados pela Covid-19, sofrem por causa do isolamento tão angustiante para um coração humano? Naquela noite, Clara experimentou profunda solidão. […] É essa solidão que apresenta ao Senhor, e Deus lhe dá a consolação de escutar os hinos cantados pelos Frades na Basílica de S. Francisco. […]

Sim, o Senhor não nos salva da história, mas na história[2], não nos salva da Covid-19, mas na Covid-19; não nos salva da solidão, mas na solidão, não nos salva do medo, mas em nossos medos.

E o medo não se tornou nosso destino quotidiano e nosso companheiro, desde o início desta pandemia? Medo do outro, do qual nós nos devemos proteger; medo do lobo que entrou no redil, medo do mal em ação dentro de nós, medo de transmitir a morte ao outro, medo, que se torna pânico, quando o vírus faz seu trabalho mortal em nossos entes queridos e quando nossos sintomas, improvisamente, dão sinais alarmantes. Como trememos diante da morte do Pobre Crucificado que, asfixiado, entrega seu espírito nas mãos do Pai! Se o coronavírus mexe conosco tanto assim, é porque toca o respiro vital dentro de nós e o destrói… […]

Raramente resulta em prazer tomar o lugar do leproso, de quem os outros fogem. Mas, quando nos deixamos amar naquela situação, quanta doçura nasce, que espaço de acolhimento, comunhão e caridade se abre! […] Em sua grande e secular experiência, a Igreja implora ao Senhor para libertar a humanidade “da peste, da fome e da guerra”. Sabemos que a crise sanitária leva a uma crise econômica, que, infelizmente, pode levar a uma crise social. […] Mais do que nunca, somos convidados a confiar na Providência, porque até agora, o Senhor não nos tem abandonado, nem nos abandonará. Viver na simplicidade, evitando todo desperdício; viver em solidariedade e esforçar-nos por praticar todo bem que nos é possível.

Talvez este acontecimento será também a ocasião para construir um novo mundo, baseado não mais sobre o paradigma da globalização em nível comercial ou cultural, mas sobre uma volta ao local, à família, ao regional[3]. Não podemos sonhar uma nova visão do trabalho, dos negócios e da economia mais inclusiva e baseada na solidariedade, onde a alma e fragilidade serão seus fecundos fundamentos?

Contamos com vocês e com a sabedoria de seu estilo de vida, a fim de ajudar-nos a ousar sermos novos depois dessa crise. Inesperadamente e bruscamente, durante as fases da quarentena, fomos obrigados, como vocês, a nos mantermos em espaços restritos e por longo tempo. Foi um contraste totalmente anormal diante do nosso anterior modo de viver nessa sociedade, caraterizada por espaços amplos (viagens, conexão social, etc.) e ritmos frenéticos (“tudo e imediatamente”, velocidade sempre maior, etc.). Alguns, que tiveram essa experiência, recordarão apenas a sofrida limitação da liberdade, o desafio de se achar diante das próprias dinâmicas sociais, a violência relacional por causa da falta de comunicação, a falta de perdão, a falta da aceitação do outro. E percebemos a riqueza de testemunho de vocês: a clausura é pequeno campo de batalha no coração do planeta. […]

Seus mosteiros são reservas de paz, serenidade, esperança e compaixão para aqueles que estão na primeira linha, na batalha. Na impotência que temos experimentado com vocês, porque não podendo sair para ajudar doentes e pessoas necessitadas, ousamos rezar em intercessão com vocês. Rezar não apenas por nós mesmos ou por aqueles que estão na solidão ou doença, mas também por aqueles que arriscam a saúde e a vida, ao cuidar dos outros. […]

Compaixão significa “sofrer com”. Este pequeno vírus nos ensinou que estamos todos na mesma barca; ele ataca indiscriminadamente ricos e pobres, poderosos e pequenos, justos e pecadores. Em solidariedade com a humanidade sofredora, ajudem-nos a perseverar na oração a fim de esperar contra toda a esperança: “Nosso auxílio está no Nome do Senhor!”[4]. Essa solidariedade transforma os limites dos confins humanos, a fim de incluir cada pessoa humana, cada ser vivente, permitindo-nos abraçar nossa verdadeira identidade de seres interconectados, que vivem numa casa comum. Essa consciência nos ajuda a assumir o papel que Deus nos tem dado quais promotores de dignidade e protetores da comunidade humana e do ambiente, Laudato Si’. […]

Minhas caríssimas Pobres Senhoras, Boa Festa de Santa Clara!

Frei Michael Anthony Perry, OFM

Ministro Geral e Servo

Roma, 25 de julho de 2020, Festa de São Tiago

Leia o texto na íntegra em: https://franciscanos.org.br/quemsomos/o-senhor-nao-nos-salva-da-historia-mas-na-historia/#gsc.tab=0.

[1] Proc III, 30.

[2] Cfr. João Paulo II, homilia de 8 de dezembro de 2004.

[3] Cfr. Giuseppe Buffon, Il futuro sotto la mattonella – Osservatore Romano, 24 abril 2020.

[4] Sl 124,8.

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